Por Camila Turtelli, Lauriberto Pompeu, Bernardo Lima e Luísa Marzullo – O GLOBO Brasília e Rio de Janeiro
Ministro da Justiça deve se encontrar com todos os 81 senadores, por orientação de Lula, para dar tração à sua aprovação para a Corte
Relator do processo de indicação do titular da Justiça, Flávio Dino, ao Supremo Tribunal Federal (STF), o senador Weverton (PDT-MA), adiantou que dará um parecer favorável à aprovação do nome do ministro, que deverá passar com margem apertada pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, onde ele será sabatinado daqui a duas semanas. Dos 27 parlamentares do colegiado procurados pelo GLOBO, dez deles declararam abertamente que votarão para chancelar a escolha de Dino e seis vão se posicionar contra. Outros 11 senadores afirmaram não saber ou não responderam. O postulante a magistrado já começou a se articular para dirimir resistências na Casa.
Já o escolhido para assumir a Procuradoria-Geral da República (PGR), Paulo Gonet, aparece em situação mais confortável: 12 apoios públicos e apenas uma declaração contrária, a do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), que também se opõe a Dino.
A CCJ é vista como um termômetro político da aceitação ao indicado. Independentemente do placar no colegiado, a indicação é apreciada pelo plenário, instância à qual cabe referendar ou rejeitar o nome escolhido pelo presidente da República.
São necessários 14 votos para aprovação, justamente o tamanho da base que o Planalto contabiliza na CCJ. Há no grupo dos que não se manifestaram sobre Dino parlamentares com os quais o governo conta como aliados, como Davi Alcolumbre (União-AP), Eduardo Braga (MDB-AM), Lucas Barreto (PSD-AP) e Angelo Coronel (PSD-BA), que afirmou querer aguardar a reunião da bancada com o ministro para se posicionar publicamente.
Dino foi eleito senador em 2022, mas se licenciou para assumir a pasta da Justiça. Nesta terça-feira, ele jantou com parlamentares governistas. Também se reuniu com Alcolumbre, que preside a CCJ, e com Weverton. O relator é aliado do Palácio do Planalto e reatou a relação com Dino, quem se manteve distante por cerca de três anos. Há a previsão de um encontro do ministro da Justiça com os parlamentares do PSD na semana que vem.
De gabinete em gabinete
Segundo aliados, Dino recebeu a orientação de Lula para conversar com os 81 senadores e estaria disposto a entrar no gabinete de todos os da oposição. Diante disso, Weverton vai sondar quais nomes mais à direita aceitariam abrir as portas ao indicado, entre eles Flávio Bolsonaro.
— Eu falei já com alguns senadores, inclusive os que não são muito próximos da base governista. Em 12 anos do Flávio (Dino) como juiz federal, não tem um caso concreto que alguém venha me dizer que ele utilizou a magistratura para beneficiar ou prejudicar qualquer um que seja de outro campo — disse Weverton.
Interlocutores do titular da Justiça estimam um placar de 17 votos na CCJ e superior a 50 em plenário, onde são necessários ao menos 41. Senadores já preveem uma sabatina de longa duração, levando até dez horas.
Quem também preferiu não emitir opinião foi o oposicionista Ciro Nogueira (PP-PI). Em outra ocasião, porém, ele sinalizou que seria favorável. Ele disse ontem acreditar na aprovação de Dino, embora prefira não adiantar o posicionamento por enquanto:
— Vou esperar a sabatina, mas acredito que é jogo jogado.
Em outubro, em entrevista ao GLOBO, no entanto, o senador havia afirmado que votaria a favor de uma possível indicação de Dino. “Não tem porque eu não votar a favor de um nome, seja qualquer nome, se ele cumprir o requisito”, justificou à época..
A divisão entre base e oposição no Senado tem mais nuances, pois há parlamentares de partidos que comandam ministérios que se posicionam com frequência contra o Planalto. Entre os 27 titulares da CCJ, há 14 mais fiéis ao governo, 11 oposicionistas e dois com perfil independente, que o Executivo tentará atrair.
Entre os que não quiseram antecipar o voto está o senador Sergio Moro (União-PR), também de oposição e que já fez críticas a Dino. O parlamentar disse que ainda está estudando as perguntas a serem feitas para o ministro da Justiça na CCJ. O confronto entre o ex-juiz da Lava-Jato e Cristiano Zanin, primeiro nome indicado por Lula à Corte neste mandato, foi um dos momentos que marcaram a última sabatina.
Senador eleito pelo PSB, Dino, de 55 anos, é ex-governador do Maranhão. Ele foi escolhido para a vaga aberta com a aposentadoria da ministra Rosa Weber, em setembro. A definição ocorreu após 59 dias de espera, recorde de Lula nos seus três mandatos. Nome de confiança do presidente, ele tem perfil combativo, o que gerou embates recorrentes com a oposição.
O senador Marcos do Val (Podemos-ES), afirma que votará “20 vezes contra a indicação” do ministro da Justiça, enquanto outros parlamentares afirmam, em caráter reservado, que a indicação de Lula foi uma “provocação”. Flávio Bolsonaro classificou a indicação de “absurda”.
Líder do PSD e aliado do governo, o senador Otto Alencar (BA) lembra que o Senado ainda vivencia diariamente reflexos da polarização. Lula sofreu uma derrota na Casa no fim de outubro quando o plenário rejeitou a indicação de Igor Roque para chefiar a Defensoria Pública da União (DPU).
— Ele está sendo indicado em um momento em que a vida nacional política ainda não está pacificada, ainda há muitas sequelas do 8 de Janeiro. Haverá votos contra dentro do colegiado, mas ele reúne condições para a Corte — afirmou Otto Alencar.
A despeito das dificuldades, em apenas cinco ocasiões o Senado rejeitou indicações para o STF: todas em 1894, na gestão do marechal Floriano Peixoto. No plenário, é necessário maioria absoluta para aprovação, o que significa 41 votos. Reservadamente, mesmo integrantes da oposição avaliam que o posicionamento servirá para ampliar o custo político do Planalto, mas que a tendência é de aprovação.
Trilha mais suave
Enquanto Dino enfrenta mais críticas, Gonet, indicado à PGR, tem menos resistência e apenas uma declaração pública de voto contrário. Após dois meses de espera, Lula o anunciou como novo procurador-geral da República, substituindo Augusto Aras, cujo mandato à frente do órgão terminou no dia 26 de setembro. Gonet não fazia parte da lista tríplice elaborada por membros do Ministério Público Federal (MPF).
— O currículo e a trajetória dele (Gonet) enquanto procurador da República o credenciam — afirmou a senadora Ana Paula Lobato (PSD-MA).
Nos 12 votos favoráveis a Gonet, há senadores que se opõem a Dino, como os oposicionistas Plínio Valério (PSDB-AM) e Marcos do Val. O resultado é ilustrativo do bom trânsito dele com a oposição, que o enxerga como um conservador. Gonet chegou a ser cogitado para a mesma vaga quando Bolsonaro era presidente. Após a indicação, a deputada bolsonarista Bia Kicis (PL-DF) elogiou a escolha.
Gonet já era um dos nomes mais citados para o posto desde junho. Ele foi um dos principais personagens do julgamento no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que tornou o ex-presidente Jair Bolsonaro inelegível por oito anos por prática de abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação. Como vice-procurador-geral eleitoral, Gonet foi o autor do parecer que pediu a condenação do ex-presidente da República.